a náusea que precede a fome

Ana vem de uma família proletária. toda ela. com exceção de um tio que foi rico durante um período em que foi diretor de uma transportadora multinacional e se enganou pensando ter pulado de classe, todos os avós, tios, tias, primos, primas todos trabalhadores, todos proletários. ficar doente nem pensar. para colocar comida na mesa todos os dias era preciso trabalhar e se deixar explorar. esse o lugar de Ana e foi nesse universo em que cresceu.

assistiu quase a vida inteira a mãe acusar o pai de não ser ambicioso e esforçado o suficiente. tinham casa própria e comiam carne todos os dias durante toda sua infância e adolescência. até mesmo naquele período de inflação galopante do final da década de 1980, comiam carne. sim, na família de Ana era prioridade. para a mãe de Ana essa era uma prioridade e era a mãe quem decidia essas coisas. a mãe passara muita privação na infância. o que fazia de Ana profunda conhecedora de todas as técnicas de enganar a fome ou aquela “vontade de comer o que não tem”; de café preto engrossado com farinha de mandioca até polenta com açúcar e leite. embora faltasse carne, sobrava o básico dos cereais e leguminosas. a avó de Ana plantava para a subsistência e para pequenos escambos com vizinhos e irmãs. em todas as casas onde a avó morou, sempre manteve horta e pomar. num tempo em que não se derrubavam árvores — era considerado burrice entre os pobres. 

Ana discutia muito com a mãe. foram muitas as brigas. a mãe queria a vida do irmão — o tio que foi rico por algum tempo. o pai de Ana achava meio brega ser rico, desnecessário, achava inclusive injusto ter mais do que se podia comer, usar, etc. dizia à esposa e filhos: “se eu só posso usar uma calça por vez, no máximo preciso de outra para trocar quando essa for lavar”. Ana achava que não precisava ser tão escasso assim, mas o pai nunca impusera — nem a mãe permitiria — sua “filosofia de vida”  à família. Ana, o irmão e a mãe tinham roupa para trocar todo dia por até dez dias sem precisar lavar. o pai viveu a vida toda praticamente com pouco mais de duas mudas de roupa. gostava mesmo era de ganhar roupa usada. as do tio materno de Ana, aquele, rico por algum tempo…. uma vez a cada dois anos, a família do tio fazia limpeza dos armários e chegava ao menos uma caixa grande com roupas usadas para toda a família. a mãe no máximo tinha que fazer ajustes. Ana dizia não se lembrar do pai comprando roupa, e achava inclusive que ele sequer saberia onde ficavam as lojas. 

nessa história aí da caixa com a limpeza dos armários da família do tio, Ana pôde usar uma sandália “melissa”, ainda no auge. em seguida foram lançadas modelos e cores novas, tal foi a “febre”, e a laranja meio ferrugem do primeiro modelo já não agradava mais as primas de Ana. talvez tenha vindo daí seu gosto pelo conforto de usar sandália com meia, mantido enquanto seus pés não inchavam tanto. agora, quase velha, ela diz que fica feio com os pés tão inchados e deixou de ser confortável.

comentava do pavor de uma reclamação reiterada da mãe: estar velha e não ter carne para comer ou querer comer algo, às vezes um simples sorvete de casquinha quando estivesse caminhando pelo centro da cidade, e não ter dinheiro para isso. muitas vezes Ana a viu chegar cabisbaixa em casa, desenxabida, se sentindo humilhada e com os gatilhos da penúria vivida na infância todos disparados. Ana ficava impaciente com a mãe e com essa sua “mania”. achava exagero dela, até… sentir ela mesma na carne como é isso do não ter, de sentir a falta pelo detalhe, de estar se aproximando da velhice sem casa própria, sem emprego fixo — embora tenha profissão e reconhecimento profissional —, sobrevivendo da solidariedade dos amigos e sem perspectiva a médio prazo de solução. 

sente uma dor quase física pela humilhação da falta do básico que diz lhe “corroer a dignidade”. é um exercício duro manter a altivez e o prumo tendo que pedir dinheiro para comprar pão, arroz, feijão, leite… e se bastasse “só” a humilhação do pedir para ter, ainda, talvez, fosse suportável — diz. mas são muitos os nãos, as desconfianças de não ser esforçada o suficiente. lembra do pai ouvindo essa mesma acusação mantendo o básico para a sua família e um teto sobre suas cabeças. Ana nem isso consegue, vive de aluguel — sempre atrasado.

a mãe de Ana morreu já faz um tempo, e ela se ressente por querer pedir perdão pela impaciência — mas só por isso, alerta. não era mania, era a falta que precede o nada, o vazio, a náusea que precede a fome. não a fome momentânea que logo será saciada… a fome que corrói as forças e a dignidade. Ana vive num tempo e lugar diferente da favela do Canindé da Carolina. ela mal conhece os vizinhos, que mesmo se soubessem de sua situação não se importariam, é o mais provável. 

essa náusea que precede a fome agora tem um nome novo: insegurança alimentar. e sempre que Ana comenta com alguém das suas relações da insegurança alimentar em que vivem ela e sua família, se arrepende. as reações são tão variadas… tem quem finja acreditar, e siga como se ela não tivesse dito nada. tem quem deixe transparecer a incredulidade. e tem quem inclusive argumente de que ela está enganada, distorcendo ou até exagerando — exatamente como ela pensava sobre a mãe.

Ana tem aquele olhar meio triste meio revolts de quem se sente injustiçada, no todo, pela vida, mas principalmente por quem a cerca. ela alterna entre a tristeza e depressão, e seus amigos dizem que assim ela mesma afugenta as pessoas de perto. (!)

sempre volta às lembranças da mãe que a julgava culpada por todos os infortúnios que a assolavam. um dia, enfurecida, Ana a questionou se ela (a mãe) era também culpada por todos os seus infortúnios. foi motivo de mais uma briga que entre tantas que fizeram elas se afastarem. quando sua mãe morreu foi ao enterro apenas para cumprir o ritual, para ver a mãe morta no caixão e virar aquela página.

Ana diz não entender como uma infância tão bem nutrida a fez tão sabedora da fome e suas humilhações, e sobre náuseas. também eu não entendo e nem consigo ajudá-la com isso.

junto com a humilhação e os lanhos na dignidade, a náusea que precede a fome traz também a raiva. uma das pequenas raivas reiteradas no cotidiano de Ana está justamente os dias alternarem entre não ter o que comer e em ser obrigada a cozinhar e comer algo que não queria só para não dormir de barriga vazia. ela diz chegar a sentir falta da infância emocionalmente ruim só pelo bife, pelas maçãs no lanche da manhã, pelo frango de panela dos domingos, pelos churrascos que reuniam a infinidade de tios, tias, primas e primos.
a náusea que precede a fome faz até os constrangimentos e abusos perderem peso e importância. 

das muitas lições do pai, a mais presente: se é injusto ter mais do que se pode comer e usar, e Ana dentre muitos muitos muitos outros e outras não têm esse básico, é porque alguém tem muito mais do que precisaria ter. 

a náusea que precede a fome não corrói a dignidade de Ana como ela sente e diz, corrói a dignidade do mundo todo. mas o mundo todo não sente essa náusea, e nem se importa com a náusea ou com a fome das Anas e Carolinas. 

mas eu não tenho coragem de dizer à Ana que ela está errada ou que o que diz e sente não é exatamente assim. 

nem tu teria.


escolhas

a conjuntura mudou. gravemente. não fosse a gravidade da situação (estamos todos em risco, alguns mais que outros e, portanto, faz-se necessário unir forças) talvez eu permanecesse no conforto da independência partidária e longe das tretas do meu sindicato e do imobilismo da minha categoria profissional. mas a conjuntura mudou. e pela primeira vez deixou de ser confortável a independência e a distância. virou omissão, covardia. e deixou de fazer parte de mim. parafraseando Caetano, o Veloso, “eu não sou mais aquela guria”. então, fiz duas escolhas que já não esperava mais fazer no limiar dos 50 anos: aceitei a indicação para a Delegacia Regional Pelotas do Sindicato dos Jornalistas do Rio Grande do Sul e me filiei ao PSol.

sei lá se são boas novas, mas entrei setembro com os dois pés esquerdos _entenda.


coisas a esquecer

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a feira livre no bairro onde cresci acontecia exatamente na quadra em frente a minha casa, toda sexta-feira pela manhã, fizesse chuva ou sol. minha mãe comprava sempre do mesmo feirante, Manoel, que montava sua banca bem na frente do nosso portão. quase sempre ia fazer a feira junto com a mãe, desde muito piá. um dia, lá pelos meus 5 ou 6 anos, a mãe terminou as compras e foi pra casa, acho que esqueceu que eu estava junto ou eu que me perdi espiando as frutas que não tinham no nosso quintal na banca em frente, sei lá. na rua eu sou sempre distraída, me perco fácil. quando me percebi sozinha na feira eu voltei pra banca do Manoel e fiquei ali plantada, estava na frente de casa afinal. me encantei com as cabeças de alho(!), e o Manoel me perguntou se minha mãe precisava de alho. respondi “não sei”, mas ele me deu as duas cabeças de alho que estavam nas minhas mãos mesmo assim _a família tinha crédito na banca. só daí eu fui pra casa. entreguei o alho pra ela e disse que foi o Manoel que mandou. ela não acreditou. me pegou pelo braço e foi me arrastando de volta até a feira. chegamos lá, ela nem perguntou nada a ele e já foi dizendo: “devolve e pede desculpas”. Manoel contou que havia me dado, confirmando o que disse. ela me fez devolver os alhos mesmo assim, ‘não devia ter ficado perambulando sozinha na feira e nem ter olhado pra alho nenhum’.

foi um dia confuso esse. fui punida e ainda fiquei de castigo por algo que nem entendi. era só mais um dia que se repetiu vida afora: a minha palavra não valia nada. dura lição essa. pra minha mãe aquilo que qualquer pessoa (e é qualquer pessoa mesmo) dissesse sobre mim era a verdade e estava encerrado o assunto. cresci com esse fantasma me assombrando. não importava o que fizesse, eu sempre estaria errada. não interessava o fato, interessava que se eu estivesse presente algo de errado tinha ou teria. e se desse merda mesmo, a culpada (lógico!) era eu.

quando penso no dia a dia da minha infância, além das luzes, das janelas, cheiros, cores e sabores, a lembrança mais presente são horas intermináveis de sofrimento, eu recolhida no quarto ou num canto do quintal tentando entender o porquê das coisas serem assim. 48 anos e eu ainda não entendi. a “verdade sobre mim” é distorcida. ainda hoje, diante de um imbróglio qualquer onde minha palavra esteja em disputa com a palavra de outra pessoa me vem esse amargo na boca de saber que ao final de tudo eu ficarei desacreditada. é fato, é imutável. eu já nem esperneio mais. me resignei.

2019 foi um ano muito difícil, principalmente porque me colocou em xeque com essa verdade imutável, DE NOVO. eu deveria brigar? sei lá se devia… só quero esquecer. o “único” problema é que a caixinha das coisas a esquecer está transbordando…


no meio do caminho

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a casa que agora abriga o Parque Jurassí é comprida como um suspiro triste. quando está calor gosto do vento que encana. quando está frio não gosto tanto. mas geralmente fico no mesmo lugar… no meio do caminho, no meio da casa.

foi onde me recuperei do susto de quase sufocar sem conseguir respirar. foi onde sentei durante boa parte do dia hoje. foi onde estava anteontem. e tresontonte… é onde tenho tentado me reorganizar, sem sucesso – óbvio.

poderia dizer que é onde posso controlar os filhotes todos – humano, caninos, felinos; mas é uma escolha que nasce da falta de escolhas. é onde estou também na vida, no meio do caminho. não como opção para escolher voltar ou seguir ou mudar, mas parada no meio da nada, em lugar algum, que leva a lugar nenhum.

diferente de antes que me cobrava o ter, ser, estar; agora já não me cobro nada, só lamento. por mim, pelas pessoas com quem poderia ter contribuído, pelo mundo que poderia ter ajudado a mudar, sei lá… apenas lamento.

e espero, o fim do dia, o começo de outro… “acontecimentos”, como diria Marina. espero.

 

 


férias igual caviar

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amigas têm observado no meu comportamento sinais de sanidade. a dor mencionada pela necessidade de afastamento de algo importante, listamento as dívidas, preocupação com o futuro… tudo isso parece ser sanidade. mas de verdade me sinto doente. e ao listar o que devo ao mundo inevitavelmente listei do que sou credora.

47 anos e meio e nunca tive férias. igual como o pagode, “nunca vi, nem comi, eu só ouço falar”. nunca nem ousei sonhar com uma viagem de férias. porque qualquer viagem me parece divertida, mesmo que seja a trabalho ou ativismo ou fugindo. mas viagem de férias, planejada, para exclusivamente passear, com algum dinheiro no bolso, NUNCA.

como é possível viver assim? como é possível chamar isso de vida? sem descanso, sem folga, sem respiro, sem ar?

de novo me encontro embretada pela vida, precisando de um novo trabalho, recomeçar (sem nenhum recurso para isso) e só querendo/precisando de férias.

a imagem desse post é meramente ilustrativa do meu desejo. não estou vendo lá no fim do túnel uma praia. isso é o mais puro delírio.

e ainda me falam em sanidade mental…


chuva e acúmulo

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chuva. acúmulo. acúmulo de chuva e outros. a chuva que se acumula a outros acúmulos e outras chuvas. e eu, que já não tenho mais para onde transbordar, chover, fugir.

tem acúmulo de escritos também, que vou empilhando nos cantos aqui, de vez em quando dou aquela encoxada na pilha para evitar que desabe tudo e adio a arrumação um pouco mais. a verdade é que as pilhas já estão escoradas umas nas outras e não há perspectivas que consiga dar um jeito nessa bagunça. por um triz de passar a chave na porta e deixar tudo quieto lá dentro e abrir uma outra sala para recomeçar o acumulação.

qualquer semelhança com “acumuladores compulsivos” não é mera coincidência. a maioria dos guardados nem sei porque juntei e guardei, mas agora não consigo jogar fora. a poeira conforme se acumula nos guardados, acumula em mim também.

dia desses tentei puxar um papelzito para ler para umas amigas num espicho de reunião feminista. tentei, eu juro. mas era espicho de reunião, já estava tarde e o meu astral anda pesado. é natural que as pessoas tenham coisas mais divertidas para fazer que me ouvir. o papel voltou pra pilha numa nova encoxada antes de fechar a porta.

não entendi quando guardar lembranças e coisas virou um problema e nem mesmo quando os dias de chuva passaram a me estressar mais do que alegrar. o barulho da água caindo na água já empoçada me causa pavor. fico sempre pensando que a água vai acumular demais. porque tudo acumula demais. o pavor de uma tragédia iminente ao alcance do primeiro pensamento mais comprido. e já que eu mesma sou o retrato do acúmulo…

os erros, os acúmulos, os temores… a chuva. não há um mísero estio à vista.

 


quando não é possível viver…

… olho os outros vivendo. e fico feliz, por eles, pela possibilidade aproveitada, pela alegria percebida. compartilho dela, mesmo que pra mim não seja igual.

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faz tempo que larguei as correntes pra lá, parei de arrastá-las. era muito peso mesmo, atrapalhava. inclusive, quando surgia uma possibilidade mixuruca de vida pra mim era impossível aproveitar com aquele peso todo. sim, sou mais inteligente que rancorosa.

mas quando as possibilidades escasseiam, como agora, vai amargurando. é inevitável. e vou espichando mais o olhar para a vida alheia. juro que não sugo energia de ninguém, nem sou invejosa. só lamento não ter um pedacinho daquilo tudo que vejo pra mim também. podia, né?

entenda. não sei bem como fiz todas as minhas escolhas, mas acho que escolhi errado em vários momentos. e tenho noção que sou também responsável por muito do que não tenho e não vivo hoje. mas acho que ou não tive uma visão completa do quadro ou realmente fui sacaneada ao fazer várias escolhas no escuro, tateando.

1989 foi o 1968 da minha geração. e está fechando 30 anos de vários momentos supimpas, decisivos da minha vida. e está impossível não lembrar, não repensar as cagadas, e também ressorrir com os acertos, com a impetuosidade, disposição, ousadia… eu fui muito feliz. vivi plenamente os meus 17 anos inteirinho, de cabo a rabo.

ultimamente tem sido mais espiar mesmo. e nos dias que virão lamentarei de novo não ter vivido esses aqui para ter o que lembrar desse tempo. é um círculo vicioso. enquanto a memória permitir, fico com aquele turbilhão do século passado.

de verdade? eu nem acreditava que ultrapassaria o século. achava que seria barrada na entrada, ou algo parecido. e de certa forma fui barrada. fiquei lá. fuén-fuén-fuééénnnnnnn…

resta a alegria do olhar, que é também triste… como a vida, no geral.

 


o tomatinho na estrada, ele… eu

tomate na estrada

preciso confessar que da mesma forma que amadureci para umas trocentas coisas e situações, me tornei intolerante para outras tantas. e não me refiro só a gente chata e sem noção que estão cada dia mais presentes na vida de todos nós. há coisas que não dou mais conta,  mesmo.

adotamos mais um filhote. Joaquim Francisco, vulgo Joca, chegou no Parque Jurassí numa terça-feira conturbada em todos os sentidos. além da falta de grana para levá-lo imediatamente no veterinário (dez dias depois ele ainda não foi), tínhamos várias instabilidades no ar. de firme mesmo só o Parque Jurassí.

apesar de ser o quinto adotado, esse é o primeiro canino que chegou filhote. Joca é de uma alegria inesgotável, mas é demônio e de caráter negativo, como os demais. e é hiperativo ao extremo. por causa da agitação excessiva estou com dificuldades para me relacionar com ele. todos os demais eu tive aquele surto de dar mais atenção e carinho ao recém chegado que aos demais nos primeiros dias. só Joca não está tendo.

foram anos a fio suportando a hiperatividade do Calvin sem medicação. e até a chegada do Joca não tinha associado a sonolência e o travamento que sinto perto de pessoas hiperativas. e embora esteja me culpando por não estar curtindo-o como deveria, sou grata a ele por me propiciar essa percepção e (re)conhecimento.

sei que tenho o direito a estar exausta e intolerante com a hiperatividade, mas me sinto culpada por não dedicar ao Joca amor, carinho e mimos na mesma medida que aos demais. enquanto escrevo ele está deitado entre os meus pés, me aquecendo inclusive. estou só o tomatinho na estrada, esperando o caminhão para me alinhar corpo e alma.


no último dia de abril

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é sempre do mesmo jeito.

é como achar uma flor/folha seca no meio de um livro e passar o dia dali em diante tendo por companhia os cheiros, sóis ou chuvas, temperaturas, sabores, gentes e até os arrepios na pele do dia em que enfiaste a flor no meio do livro.

basta um acorde, uma cor, um verso. nem precisa fechar o olhos e já estou viajando. nem sempre é agradável. ultimamente trazem junto lágrimas. ando com uma saudade doída de mim. de como era, dos sonhos que acalentava e se perderam, das coisas que não vivi, dos abraços que não dei nem ganhei, das pessoas e lugares que não conheci.

sei que ainda posso. enquanto estiver respirando poderei e blá-blá-blá-whiskas-sachê, mas a gente vai envelhecendo e o que era muito fácil antes agora já parece um calvário. igualzinho aquele poema que o Borges não escreveu. não tenho 85 anos e nem estou morrendo, mas quanto mais os 50 se aproximam menos possibilidades sobram diante dos olhos. os caminhos estreitaram, empedraram e espinharam demais.

o tempo de caminho fácil e aberto trazido à tona neste último suspiro de abril era justamente um tempo perdido, ali entre a Escola Técnica e a faculdade de jornalismo, que sempre defino como desvio no sentido da produção de algo útil. embora intenso, como quase todos os anos daquele período, é como se tivesse jogado fora as possibilidades que tinha. e foram-se junto a disposição para tudo e qualquer coisa. quando olho para aquela Niara sorrio, tanto quanto balanço a cabeça em sinal de reprovação.

ao mesmo tempo que lamento o erro de perder o tempo para algumas coisas penso que deveria ter errado mais. sou muito condescendente com as Niaras de antes e muito crítica com a atual. será melhor inverter? crise existencial justo hoje, vejam só.

hoje, que teve um monte de merda pra dar conta. ataques à universidade pública e sua autonomia por este governo fascista de merda, uma deputada cretina querendo tirar o Paulo Freire de patrono da educação brasileira (ele que é nosso maior legado justo nesta área em que somos tão débeis), ter que assistir o Rodrigo Nhonho Maia virar defensor da Constituição e paladino da democracia, um desabafo soco-no-estômago do Márcio Chagas por todo o racismo sofrido no futebol gaúcho… e na finaleira do dia… ainda tivemos que nos despedir de Beth Carvalho.

deixo aqui uma promessa: no dia da derrota destes fascistas de merda cantarei VOU FESTEJAR a plenos pulmões e sambarei na cara da hipocrisia da sociedade toda. “terei minha vingança, nessa vida ou na próxima”. por todos nós, e pela Beth.


destino

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é muito difícil admitir não ter dado certo na vida para a única coisa que realmente tu sonhaste ser e fazer. eu já tinha tentado admitir isso uma vez. mas não foi suficiente, não foi completo. nunca será. acho que nunca vou conseguir, por mais repita mil vezes. eu sempre achei que tinha o dom, a vocação, o faro para jornalista. e cada vez que farejo uma notícia, um grande furo, que planejo mentalmente a estrutura de uma reportagem que nunca vou realizar, dói. DÓI MUITO.

ahh, Niara… tu poderia fazer os cursos online. existem vários. tudo EAD. são baratos, inclusive. [mas ninguém conta a falta de tempo no meu dia a dia, e nem de grana, por mais merreca que seja. e adivinhem? FALTA. o tempo todo, todo mês, várias vezes no mês. chega a ser piada me dizerem que 150 pila não é nada por um curso de especialização da Abraji quando estou juntando as moedas pro gás ou para termos comida até pingar o próximo pagamento]

ahh, Niara… por que tu sempre dá as dicas de graça? faz o texto inicial. ao menos daria para reivindicar a coautoria da matéria. [cara, as pessoas não pegam nem as dicas mastigadinhas, de graça. imagina impondo parceria ou cobrando? RÁ! isso é piada. e de mau gosto, viu?]

ahh, Niara… mete a cara. FAZ. tu tem capacidade pra isso. [olha, eu nunca duvidei da minha capacidade e inteligência. mas o mundo insiste em negar as condições. o universo conspira contra. e a essas alturas do campeonato eu já não sei mais como lutar contra]

jornalismo é exercício, não é um diploma mofando na gaveta e nem um título que se ostenta. não dá dinheiro, não abre portas, não nada. jornalista é quem exercita a profissão diariamente, quem vive disso e para isso. e nem estou fazendo juízo de valor sobre de que lado estar, a qual senhor servir ou se cumpre o juramento, o código de ética profissional.

desde julho venho farejando uma reportagem imensa. era um escândalo local, virou estadual e agora pode ser nacional. eu já cantei a pedra. já “dei de graça a dica”. mas assim como o grande esquema das empreiteiras que financiavam campanhas, políticos e partidos que farejei lá em Niterói e vi estourar dois anos depois já como escândalo policial, ninguém aproveitou. ninguém me deu crédito. e por que dariam, né? nem eu me daria crédito. a probabilidade é que seja mais uma história que verei mal apurada estourar de novo já como escândalo policial daqui a algum tempo.

não tenho as ferramentas. não fiz cursos complementares de metadados nem de como investigar empresas (tem um com inscrições abertas agora na Abraji; mais um que não farei) nem tenho a experiência que só o exercício diário da profissão te dá, junto com as fontes, os “contatinhos” que te mantém no curso certo de uma investigação.

então… acho mesmo que tenho a capacidade, o faro, o “dom”, mas nunca tive as condições nem as oportunidades. porque não basta a oportunidade quando tu não tem condições de aproveitá-la. trabalho não espera filho crescer (o meu nunca irá), acabar a aula/prova/seminário/apresentação do companheiro mestrando, nem a casa ficar silenciosa para teres condições de escrever. 

às vezes penso que me sabotei mesmo, bonito, lá durante a faculdade quando tive o Calvin… e nem vou entrar no mérito das condições desse “ter”.

autocomiseração é uma merda. mas preciso reconhecer que em algum momento meu destino _eu junto_ se quebrou. ou nunca existiu. ou a vida era só isso mesmo.


cara de outono

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meu pai era um mecânico por vocação. inventivo, criativo, generoso, olhar doce, jeito de gente boa. caladão, contemplativo, um leitor voraz. generoso e complacente inclusive com os ignorantes. de vez em quando hipotecava algum tempo tentando iluminar mentes obscuras, não se vangloriava se conseguia e nem reclamava se não. irônico e sarcástico como são em geral as pessoas muito inteligentes e observadoras da realidade.

na sua internação hospitalar em 2003, seus últimos dias, quando eu não estava trabalhando estava em casa com o Calvin pra minha mãe estar no hospital com ele. sobrou pro meu irmão a tarefa desses cuidados na maior parte do tempo. e acabou que só fui visitá-lo uma vez. não sabia explicar, apenas não conseguia ir. sabia que ele estava partindo e só tinha vontade de fugir.

na tarde em que fui visitá-lo finalmente, uns três ou quatro dias antes dele morrer, cheguei quando a enfermeira tentava convencê-lo a se alimentar. ele resistia. o café devia ser muito ruim mesmo para ele recusar. mas tinha também a posição, ele estava sentado na cama e respirava com muita dificuldade, as dores _diziam_ eram horrendas. ele tinha cardiomiopatia severa.

quando a enfermeira me passou a tarefa de fazê-lo comer e saiu, perguntei se ele não estava mesmo com vontade de comer, ele disse não, não insisti. fiquei um pouco em silêncio e ele me olhou com aquele olhar crítico de sempre e em um segundo deixou claro todo o seu descontentamento pela minha ausência. perguntou, sarcástico e agressivo: “veio fazer alguma matéria jornalística com doentes terminais?”

saí do quarto aos prantos, me escorando pelas paredes daquele lugar detestável. nunca mais o vi.

fazem quinze anos hoje que ele se foi, me deixando setembro para sempre com cara de outono.


sigo errando…

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saí para participar de um programa de rádio pouco depois do meio dia sem tomar café. (erro 1)

num outro espaço que não a rádio, fui sincera como quase sempre sem medir palavras. e me-senti/fui fiscalizada, atropelada. (erro? 2)

ao invés de fincar o pé, me impor e perguntar “qualé?”, me desculpei pelo erro que não cometi e conciliei quando não quero mais conciliar e consciente que não valerá o esforço. (erro 3)

cheguei em casa e emendei o café da manhã com almoço e comi com raiva (erro 4), com direito a engasgo e choro involuntário que desencadeou num voluntário. porque poucas coisas me chateiam mais do que ser fiscalizada e essa sensação de não poder ser eu mesma. como se devesse algo, sabe comé?

agora estou aqui mei que passando mal e lembrando que embora eu estivesse mesmo doente todas as vezes que hibernei (digamos assim), não era só a falta de condições físicas e mentais de sair e permanecer no mundo. é que realmente esse mundo não me apetece muito. não desse jeito.

hoje, embora esteja bem e bem longe do abraço sombrio da depressão, senti vontade de hibernar. largar tudo pra lá e me afastar de tudo e todos (e aqui pode morar o erro 5, onde já não tenho mais espaço para errar).

fazia muito tempo mesmo que não comia com raiva. eu e o Gilson nos esforçamos para construir e manter o Parque Jurassí como um espaço de paz, um refúgio das agruras do mundo como deve ser todo lar digno do nome.

sim, preciso me preservar mais. estar mais atenta dos terrenos por onde piso e as pessoas que tenho mantido por perto. a questão é sempre me convencer que o andar vale esse esforço extra aí. é por isso que eu paro de vez em quando.

sabe o dia que parece uma matrioska de erros?


da memória e a dor da resignação

 

dizem que tem explicação a memória e o nosso acesso à gavetas antigas e fechadas há tanto tempo. sei lá. nunca sei de onde me vem as lembranças. simplesmente chegam e se instalam de um jeito… chega doer no osso do peito. e nunca vêm sozinhas, é sempre de caminhão.

foi de repente que lembrei da minha avó Carolina levantando tarde da noite porque tinha ouvido alguém lhe chamar no portão. sempre desconfiei que ela adivinhava alguém precisando dela, do seu colo, e chegando no portão e acordava para receber, porque quem estava acordado não ouvia, só ela. cresci vendo essa cena se repetir. meus tios e tias e primos e primas chegando para passar a noite porque tinham brigado em casa, estavam separando, estavam no caminho entre Porto Alegre/Camaquã e Rio Grande e chegavam pra comer/dormir e aproveitavam para pegar um colo.

minha mãe nunca foi acolhedora assim. daí que esse colo coletivo e acolhedor e esse hábito na minha família se foi junto com a minha avó no carnaval de 1994. cresci entendendo o mundo errado, daí. achei que o mundo era assim, e quando eu precisasse teria colo e acolhimento na porta em que batesse. minha amiga da vida toda Fernanda e a família/casa/pais dela fizeram perdurar essa impressão errada em mim.

foi só depois do Calvin que descobri da maneira mais dura que era só a minha a Vó Carola e a família da Fernanda mesmo. e veio a lembrança de um dia horrendo em que não suportava mais a tortura diária, o aniquilamento, a cobrança e saí sem rumo com o Calvin pra rua já quase anoitecendo. fui parar na casa de uma amiga que não tinha como me abrigar e comecei a ligar para todos os amigos e amigas que lembrei. eu só precisava de uma noite de acolhimento como o da minha avó, tentar dormir bem e recuperar as forças para seguir enfrentando o horror em que vivíamos naqueles dias e anos.

lá pelo oitavo não e já não sabendo mais como lidar com a situação fui obrigada a me resignar. o processo de resignação é o mais doloroso pra mim. é minha maior aversão, reconhecer a falta de forças e voltar atrás de cabeça baixa, já humilhada para ser humilhada de novo. e o estranho de lembrar dessa dor é que faz tempo que não preciso vivê-la. vivo dias tranquilos em que não sinto falta de acolhimento ou afeto.

entre esse dia lá que precisei de uma outra Vó Carola e não encontrei foram uns dez anos tateando no escuro. só fui rever a generosidade e a solidariedade humana em sua forma mais fácil e simples quando decidi virar minha própria mesa e ir embora de Pelotas em busca sei lá de que. buscava vida, acho. encontrei bem mais que isso. e refiz minha cartela de amigos.

o sentimento é mais ou menos como os versos dessa música

i walked across an empty land
i knew the pathway like the back of my hand
I felt the earth beneath my feet
sat by the river and it made me complete

oh! simple thing where have you gone?
i’m getting tired and I need someone to rely on

e essas memórias e dor aí puxaram outra, de quando era universitária e viajava o país de ônibus. horas e horas de estrada quase sempre com uma mesma música na cabeça… mas aí já é outra história.


do direito à autonomia

tenho sol e ascendente em capricórnio, dizem. o comentário mais recorrente sobre minha personalidade é “só pensa em dinheiro” quando esse é o assunto. sabe o que é engraçado? sou a pessoa que menos pensa, se liga ou se importa com dinheiro. talvez o ascendente ao invés de potencializar o sol o anule, vai saber? amigues astrólogas nunca disseram isso, mas eu acho que é isso que ocorre. ou talvez minha lua em câncer seja o que mais me define, vai saber?

o que sei é que as características mais marcantes dos nascidos entre 22 de dezembro e 20 de janeiro que carrego é ser rancorosa e precisar de chão firme para estar, trilhar, ser. não é fácil ser essa que sou. juntar o não saber ganhar dinheiro nem se importar com o vil metal com o rancor e a necessidade visceral de chão desenha a contradição em si, e fode minha existência.

estou chegando aos 47 anos sem casa própria e sempre na iminência de ir morar na rua, desempregada, sem sequer conta no banco e dependendo da ajuda de amigues para sobreviver. bons, caros e raros amigues, é preciso observar e agradecer, mas que já devem estar cheios de terem que me ajudar _estou eu também cheia de precisar da ajuda deles_, e é aqui que o caldo entorna.

o capitalismo é perverso, destrói até o que deveria ser condição sine qua non para esquerdistas. meus queridos amigues sequer percebem quando atropelam meu direito à autonomia. e reproduzem os já bem gastos e conhecidos “pobre não pode ter frescura”, “cavalo dado não se olha os dentes” e quetais.

bueno, eu sou pobre e tenho frescuras. tenho problemas de estômago, alergias de pele e sofro de depressão. minha condição atual não é um mero destino de uma inata capricorniana que não sabe e não gosta de ganhar dinheiro. as opressões acumuladas somadas às minhas frescuras me arrancam as forças e minha alegria mais genuína que é trabalhar e exercer minha profissão _aquela a qual já até renunciei.

e eu posso até não saber/querer ganhar dinheiro, mas cresci multitarefas, multitalentos. sei cozinhar, sou boa em atividades manuais que requerem criatividade, tenho uma boa noção de semiótica e, dizem, escrevo razoavelmente bem para além das técnicas e do beabá do jornalismo. mas tem dias que o olho não brilha, o paladar e olfato somem e os sonhos se esgueiram pelas sombras fugindo de mim, a acidez no estômago acentua, a pele empelota e o ânimo-desejo-necessidade-vontade desaparecem.

eu sei que tenho um filho pra manter, três bocas humanas e duas caninas para alimentar, ainda tenho uma casa para cuidar e, portanto, não poderia me dar ao luxo dessas frescuras todas… mas tem dias em que nada disso importa. e os “levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”, “vai à luta”, “pega esse touro pelo chifre” me oprimem e deprimem mais do que incentivam ou ajudam.

se tu é amigue meu/minha, mesmo, não me insulte perguntando “por que não faz num-sei-que-lá?”, “já tentou sei-lá-o-que?”, “fazer patatá tem dado um bom dinheiro”, “cortar a assinatura da tevê economizaria um bom dinheiro”. a intenção pode e deve ser a melhor, eu acredito, juro!, mas dói tanto ler e ouvir… não sou vagabunda, nem escorada, nem abusada ou sem noção ou gosto dessa situação vexatória de não conseguir garantir meu próprio sustento com meu trabalho. e dói mais ainda precisar verbalizar isso a quem amo.

eu já pensei e já tentei. e já repensei e já tentei de novo, mesmo sem condições para tentar nada. e de novo não deu. se existisse uma mísera possibilidade de sair dessa situação sozinha com minhas perninhas eu já teria saído.

de todas as dores que me corroem a alma, a autonomia ser uma conquista exclusiva do dinheiro é a que mais me afronta, ofende e calou _até hoje. eu deveria ter direito à autonomia junto com a vida, tanto quanto tenho direito à vida, independente de como vivo ou sobrevivo. todas as pessoas deveriam ter. porque vida sem autonomia é subvida, é não ser cidadã ou ser cidadã pela metade, é ser pessoa de segunda (terceira, quarta…) categoria.

tem bem pouca serventia bradar por um outro mundo, um novo marco nas relações ou pela substituição do parâmetro do capital pelo humano se no dia a dia reproduzimos e reforçamos as opressões do capital sobre seus desvalidos.

engraçado. nunca tinha me pensado ou dito como desvalida. mas os tais privilégios que o escalonamento das opressões me conferem não me estão sendo úteis. sou uma desvalida do capital. curso superior, computador com internet, tevê a cabo, microondas, nada disso me conferiu autonomia. até pros meus amigues queridos eu não tenho direito a escolhas enquanto não “tomar vergonha na cara e der um jeito de ganhar dinheiro”, esse objetivo tão nobre e tão significativo-significante da vida…

então, é isso. estou me causando a dor imensa de expor minhas vísceras e mazelas desse jeito para quem sabe deixar de sentir a dor monumentalmente maior de não ter minha autonomia respeitada por quem amo/me ama.

se me ajudar a sobreviver não é compatível com respeitar minha autonomia, por favor, não me ajude. há mais dignidade na morte do que viver assim.

 


na corda bamba, uma síntese

instabilidade

há situações que me desgraçam a cabeça. minha geladeira e despensa não resistirem a uma semana de intempérie; a casa suja e bagunçada e estar ao mesmo tempo desanimada para limpar/arrumar; dever grana ou favor para amigue(s) e não conseguir pagar/devolver; estar desempregada; e todas essas situações atrapalhando minha criatividade e capacidade de superação.

tudo isso, junto ou separado, acaba me deixando doente. certeza que têm uma imensa influência no meu pescoço quase sempre empedrado, nas noites mal dormidas, nos nós das minhas costas e nas consequentes enxaquecas, e nos ataques do “asiático” _aquele oriental canalha e desgraçado!

esse é o quadro atual.

a boa notícia? é no meio desse caos que estou me livrando dos braços da depressão e nadando de volta a minha superfície. não poderei me dar o luxo de esperar um momento melhor.

esse já é o sexto ciclo. que não venha o próximo.não me afoguei por pouco dessa vez. e que em algum momento minha capacidade criativa dê jeito nesse caos, em meio a ele. acho que meu coração não suporta mais tanta instabilidade, tanta corda bamba…

eu gosto é de chão, firme, para caminhar descalça.

=/