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Por que Pimenta com Limão?

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Ontem, duas discussões no Twitter me estressaram. Quem me conhece pessoalmente sabe que não é muito difícil me estressar. A tolerância é um exercício, mas conforme eu consigo esticá-la em algumas coisas, menos sobra em outras. Na verdade são opções minhas não tolerar determinadas coisas por respeito a minha história de vida. Com algumas coisas não quero mais ser tolerante. Vou falar de duas, presentes nas discussões de ontem.
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Falsa neutralidade

Alguém ainda acredita nesse discursinho furado “não tenho ideologia, tenho opinião”? Estou simplesmente saturada desses jornalistas de centro/direita que se julgam acima do bem e do mal e acham que conseguem enganar a todos com suas maravilhosas crônicas críticas a tudo e todos. Suas críticas atacam sempre aos mesmos, mas de vez em quando citam aqueles com quem simpatizam para ‘provar’ sua “neutralidade”, “isenção” e “ética”. (Com licença, fui ali vomitar e já volto!)

Eles julgam nós da esquerda como histéricos. Como se histeria fosse privilégio de apenas um dos extremos. Mas o que dizer desse ex-coronel citado na crônica de Marcelo Rubens Paiva? Não é histeria achar que comunistas “comem crianças e que são o mal encarnado na Terra”?

Os falsos neutros não sabem, mas servem como arma no jogo sujo da direita, para quem ainda identifica as trágicas experiências do socialismo autoritário e burocrático do Leste Europeu com a teoria de Marx. É comunista? Não presta. E para quem acha esse tema superado, prestem atenção no discurso atual da mídia, onde os defensores do PNDH-3 são classificados como subversivos perigosos.

Foi Max Weber quem disse – e não Karl Marx – “Quem se declara neutro já se decidiu, mesmo sem saber, pelo lado mais forte”. Não se encaixa como uma luva no caso dos falsos neutros?

Machismo dissimulado

Nesses tempos chatos onde prevalece o ‘politicamente correto’ e onde as pessoas escondem o que realmente pensam para não serem crucificadas em praça pública, os preconceitos são todos varridos para debaixo do tapete. Vez ou outra afloram, como no caso de Boris Casoy. É como manter uma mola encolhida.

A direita finalmente está perdendo a vergonha e colocando a cara na janela, mas os machistas e os racistas cada vez se escondem mais. Duas leis em vigor no Brasil, necessárias para coibir os abusos cometidos contra mulheres e negros, contribuem pra isso: Lei Maria da Penha e a Lei Caó(*), que combatem as agressões mais grotescas mas só fazem o preconceito aumentar. É como se os racistas e machistas ficassem com raiva por terem seus instintos reprimidos.

Mas quero mesmo é falar daquele machismo embutido em todas as relações e que afloram na forma de pequenas grosserias no dia a dia. Ontem, ao reclamar da chatice de uma discussão teórica que não levaria ninguém a lugar nenhum – ou seja, aquelas velhas discussões sobre o “sexo dos anjos” -, li um sintomático: “Basta não ler se não quiseres”. Simples assim. O detalhe é que essa discussão era no Twitter, onde não ler ou não escrever é ficar de fora de uma discussão.

Entenderam? O macho em questão (talvez não tenha se dado conta, considero também que possa ser um simples caso de reprodução automática) me disse com outras palavras para cair fora da discussão e parar de perturbar. Já ouvi a mesma coisa, nas mais variadas formas, centenas de vezes em longos anos de militância. Não admito mais esse tipo de grosseria comigo e não gasto meu tempo discutindo com pessoas capazes desse tipo de coisa. Simples assim.

Os dois casos de estresse de ontem resultaram em “unfollow” sumário. Deixei de seguir os perfis dos dois cidadãos no Twitter, o “falso neutro” e o “macho alfa que tenta ganhar discussão falando grosso”. Isso mesmo, sou radical.

Sempre me perguntam porque meu blog pessoal se chama Pimenta com Limão. Alguma dúvida ainda?

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(*) A Lei Caó é de 1989, de autoria do deputado constituinte Carlos Alberto de Oliveira (PDT-RJ), e classificou os crimes de racismo como inafiançáveis e imprescritíveis. Em 1997, a Lei n.º 9.459 previu as penalizações e por isso muitas pessoas acham que a lei anti-racismo no Brasil só passou a valer a partir desse complemento.