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O próximo embate pela abertura dos arquivos da ditadura

Durante a terceira blogagem coletiva pela abertura dos arquivos da ditadura e nos dias subsequentes, muitas foram as notícias pipocando na grande imprensa sobre o assunto. Obviamente pelo aniversário do golpe militar no Brasil e pelas notícias vindas de nossos hermanos. Fato é que a pressão sobre a Dilma Rousseff aumentou bastante e isso infla nossa esperança.
Ainda no dia 1º de abril a Revista Época publicou reportagem sobre a investigação feita pelo governo em Petrópolis (RJ) que compara semelhanças entre corpos enterrados em cemitério local e 17 vítimas de tortura desaparecidas durante a ditadura. Esses desaparecidos foram vítimas da chamada “Casa da Morte” de Petrópolis e entre eles estão Heleni Guariba, Honestino Guimarães, Sérgio Landulfo Furtado e David Capistrano. Heleni e Capistrano são dois dos desaparecidos lembrados na campanha pela abertura dos arquivos da ditadura promovida pela OAB-RJ
Quase 50 anos depois, finalmente, a filosofia voltará aos currículo escolar do ensino médio brasileiro a partir de 2012.
No dia 5 de abril estreia a novela Amor e Revolução no SBT. Apesar de ser fraca dramaturgicamente e contenha muitas falhas na pesquisa histórica, a novela mostra um retrato mais próximo do real dos “maléficos terroristas e comunistas”  e traz os porões da ditadura à tona ao final de cada capítulo com os depoimentos de ex-torturados e combatentes contra a ditadura. Os relatos além de emocionantes cumprem o papel de contar a história que o Estado brasileiro se nega a rever.
Foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) no dia 6 de abril a Portaria n° 417, que regulamenta o procedimento de acesso aos documentos do regime militar (1964-1985) sob a guarda do Arquivo Nacional, vinculado ao Ministério da Justiça. A portaria desburocratiza e torna claro como deverá ser o processo para se ter acesso aos arquivos.
O senado uruguaio derrubou no dia 12 de abril sua lei de anistia, que havia sido confirmada em plebiscito junto da eleição de Pepe Mujica, e que permitirá que seus militares e torturadores possam responder por seus crimes.
A Argentina, que já julgou e condenou quase 500 torturadores, condenou (14/04) à prisão perpétua o último militar a presidir o país durante a sua dutadura, Reynaldo Bignone, de 83 anos, e o ex-oficial da polícia, Luis Patti, de 59 anos. A pena será cumprida em prisão comum e a sentença foi transmitida ao vivo pelas principais emissoras de televisão argentinas, onde a juíza María Lucía Cassaín pronunciou “por crimes de lesa humanidade são condenados à prisão perpetua”.
E por fim, no dia 14 de abril acordamos com a notícia, publicada pela Folha de São Paulo, que a presidenta Dilma Rousseff determinou à base aliada do governo no Senado que encaminhem o fim do sigilo eterno dos documentos da ditadura. Deveríamos comemorar? Não. Infelizmente não!
Nós, blogueiros participantes da campanha #desarquivandoBR, invejamos nossos hermanos e sentimos muita vergonha pelo Brasil não ter feito nada até agora nem para passar a história do período militar à limpo nem para punir os torturadores. Torcemos pela chegada do dia em que Dilma carimbará os arquivos secretos hoje classificados como “sigilo eterno” como públicos. Mas eu particularmente esperava que a presidenta fosse chamar para si a responsabilidade de abrir esses arquivos, já que tem poder para isso. Dilma joga a responsabilidade para o Senado e nos joga numa batalha infinita na disputa pelo voto dos senadores e depois dos deputados. Precisaremos ter estômago para assistir a grande imprensa defendendo o golpe e os militares assassinos e torturadores além de enxovalhar ainda mais a memória dos mortos e desaparecidos e dos ex-combatentes e torturados.
Se não há outro jeito, vamos nos concentrar na luta porque o momento nunca pareceu tão favorável a termos de fato os arquivos abertos e, quem sabe, encontrados os restos mortais dos desaparecidos. Não sei quanto a vocês, mas eu só paro essa luta quando meus camaradas da esquerda, os que tombaram e o que sobreviveram, forem justiçados. Pela memória deles e do país, precisamos nos organizar para mais esse embate. Bóra? Façam dos comentários desse post o espaço para sugestão de ideias e organização do próximo embate pelo desarquivamento do Brasil.


Mulher, guerrilheira e agora presidenta

Hoje é um dia histórico para o Brasil, assim como foi o dia 1º de janeiro de 2003. Depois de empossar o primeiro operário de esquerda como seu presidente, o Brasil irá empossar a primeira mulher de esquerda (*) como sua presidenta. Dilma Vana Rousseff tem em seu currículo alguns “agravantes” como ser ex-guerrilheira, assim como o atual presidente do Uruguai José Pepe Mujica,  ter sido torturada durante a ditadura militar, assim como a ex-presidenta do Chile Michele Bachelet, e ser solteira (oi?).
Estou fazendo essa relação com os demais países do Cone Sul por dois motivos. O primeiro é que aos poucos, o processo de tomada de poder pelas forças populares e de esquerda que se avizinhava nas décadas de 60 e 70 na América Latina e interrompidos à força pelas ditaduras militares patrocinadas pelos EUA, retoma o seu curso “natural”. A América Latina vem dando passos significativos rumo ao rompimento de sua histórica opressão e exploração e está acelerando o passo. Afora o Chile e Honduras, onde a esquerda teve retrocessos, nos demais países essa identidade latino-americana se fortalece.
Segundo porque esse é um dia histórico também para as mulheres latino-americanas. Depois de Michele Bachelet, Cristina Kirchner – atual presidenta da Argentina e provável candidata à reeleição este ano – agora teremos também no Brasil uma mulher no comando da nação. Dilma venceu uma campanha nojenta de tão suja e baixa e apesar de não ter votado nela por motivos que já relatei aqui, não deixo de reconhecer o mérito de sua vitória. Ela saiu dos bastidores, saiu debaixo da asa do presidente Lula, fugiu do scrip e, imprimindo o seu jeito de ex-guerrilheira disciplinada à sua causa misturado ao seu pragmatismo de economista e generosidade de mulher, foi derrubando preconceitos e vencendo covardias.
Nada fácil ser mulher e ser vitrina num país preconceituoso como o Brasil, que finge não ser racista mas trata negros como cidadãos de segunda classe e acha que cota é segregação. Finge não ser homofóbico mas incentiva os crimes contra homossexuais repetindo surras e assassinatos na tevê que ficam impunes (e ainda insinua o tempo todo uma suposta homossexualidade da presidenta eleita por ser ela solteira e independente). Finge tratar a todos igualmente, mas dá tratamento jurídico diferenciado a ricos e pobres e torce o nariz ao ver suas lojas, supermercados, aeroportos – antes exclusivos da burguesia e classe média – invadidos por pobres. Finge não ser machista, mas trata feminicídios como crimes comuns e pune duplamente as vítimas desqualificando-as moralmente através de sua sexualidade, e trata aborto como tema político e religioso. É preciso ter estômago. Dilma teve. Enfrentou tudo isso com coragem, meses depois de ter vencido um câncer e ainda teve a dignidade de não usar a doença, tratamento e recuperação como arma midiática na sua campanha.

Entendo a presença de mais de cem blogueiros progressistas, sujos ou de esquerda hoje em Brasília para cobrir a posse presidencial. Eles trabalharam duro na defesa da canditura de Dilma – embora eu ache tanto envolvimento complicado, a blogosfera tem essa liberdade e a honestidade de escancarar suas bandeiras – e estão orgulhosos do seu trabalho pela democratização da comunicação, se sentem partícipes da vitória de Dilma e desejam ardorosamente ver a milicada bater continência para uma guerrilheira. Vibrei vendo Mujica diante das Forças Armadas uruguaias e vibrarei ainda mais vendo Dilma diante das Forças Armadas brasileiras. Porque sabemos que a tortura é ultrajante (dizendo o mínimo) para qualquer ser humano, mas – prá variar – é mais cruel com as mulheres. É simbólico e emocionante que Dilma tenha convidado suas companheiras de cárcere para estarem presentes hoje em sua posse em Brasília.
Claro que tenho minhas críticas e continuarei tendo. Não abro mão de minhas lutas, princípios e bandeiras e penso que a crítica justa é fundamental para acertar o passo e não desviar do caminho e espero que a memória da presidenta não fique apenas nos simbolismos e protocolos cerimoniais. Mas reconheço o tamanho desse dia para o Brasil, para as mulheres e para toda a América Latina e torço para estar errada em minhas previsões mais negativas. Lula cometeu muitos erros, mas acertou em cheio ao reforçar a unidade latino-americana. Sua eleição reverberou e impulsionou muitas outras vitórias da esquerda no continente e eu espero que a eleição de Dilma impulsione muitas vitórias mais, da esquerda e das mulheres latino-americanas.
Meu desejo nesse primeiro dia de década? Que este continente seja varrido pelos ventos da liberdade e da justiça. “Bora” começar a bater as asas?
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Loca por ti, America!

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(*) É preciso diferenciar o fato de eleger uma mulher de eleger uma mulher de esquerda. Yeda Crusius como governante não se diferenciou em nada de um homem. E embora eu tenha críticas sobre o quanto o PT, Lula e Dilma estejam à esquerda na política, e economicamente não se diferencie muito dos demais governos e propostas, no campo das políticas sociais as diferenças são brutais de governos da direita, PSDB e afins.
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Nota: Sobre o início do governo de Tarso Genro e a volta do PT ao governo do Rio Grande do Sul, não vou me manifestar agora. Vou apenas comemorar o fim do desgraçado desgoverno Yeda. Pode?

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Mujica tumultua Montevidéu ao caminhar pelas ruas há três dias de sua posse como presidente

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A partir de segunda-feira o Uruguai terá como presidente um homem simples, de hábitos simples, e que, pelo visto, não se deslumbra com o poder. Longa vida ao ex-guerrilheiro tupamaro Pepe Mujica!
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Ana Olivera e Pepe Mujica na caminhada da Frente Ampla, pela avenida 18 de Julio, em Montevidéu (foto: EFE)

Presidente eleito do Uruguai, José Mujica, tumultuou o centro de Montevidéu nessa sexta-feira ao participar de uma caminhada ao lado da candidata da Frente Ampla ao governo da capital, há três dias de sua posse como presidente.

Fiel ao seu estilo informal, Mujica caminhou dez quadras da avenida principal da cidade, 18 de Julio, para acompanhar Ana Olivera no primeiro ato de sua campanha para as eleições municipais marcadas para 9 de maio. Vigiados apenas por um pequeno grupo de militantes, que formaram uma corrente humana ao seu redor, Mujica e Ana Olivera caminharam juntos com outras mil pessoas, enquanto dezenas de jornalistas se esforçavam para tirar fotos.

A caminhada que durou aproximadamente 15 minutos causou surpresa entre os cidadãos que não esperavam a presença do futuro presidente e o receberam com sorrisos, gritos e aplausos. Muitas pessoas tentaram tirar fotografias junto com o ex-guerrilheiro tupamaro. O ato foi encerrado na Praça Independência, mesmo local da cerimônia de posse de Mujica na próxima segunda-feira.

Em conversa com jornalistas, Olivera disse esperar que sua campanha tenha como principal característica “o contato com as pessoas”. Ela afirmou que pretende percorrer Montevidéu “palmo a palmo”.

A candidata da Frente Ampla é apontada como favorita. Pesquisas de intenção dão a ela índices de preferência superiores a 50%. Olivera tem 56 anos e milita no Partido Comunista, integrante da Frente Ampla. Se eleita, será a primeira prefeita mulher de Montevidéu em 101 anos de processos eleitorais.

(fonte Telesur e Ansa)