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O tempo

O tempo dos maias nasceu e teve nome quando não existia o céu e a terra ainda não tinha despertado.
Os dias partiram do oriente e começaram a caminhar.
O primeiro dia tirou de suas entranhas o céu e a terra.
O segundo dia fez a escada por onde a chuva desce.
Obras do terceiro foram os ciclos do mar e da terra e a multidão das coisas.
Por desejo do quarto dia, a terra e o céu se inclinaram e puderam encontrar-se.
O quinto dia decidiu que todos trabalhassem.
Do sexto saiu a primeira luz.
Nos lugares onde não havia nada, o sétimo dia pôs terra.
O oitavo cravou na terra suas mãos e seus pés.
O nono dia criou os mundos inferiores.
O décimo dia destinou aos mundos inferiores quem tem veneno na alma.
Dentro do sol, o décimo primeiro dia modelou a pedra e a árvore.
Foi o décimo segundo quem fez o vento. Soprou vento e chamou-o de espírito, porque não havia morte dentro dele.
O décimo terceiro molhou a terra e com barro modelou um corpo como o nosso.
Assim se recorda, em Yucatán.
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Do livro Memórias do Fogo, Nascimentos de Eduardo Galeano
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Locos por ti, America!
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* Porque voltei a sentir a mão pesada do tempo interferindo no meu tempo particular…
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Te vi…

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“…
Te vi, te vi, te vi
Yo no buscaba a nadie y te vi
…”
(Un Vestido Y Un Amor, Fito Paez)
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Locos Por Ti, America!


O Mundo

Um homem da aldeia de Neguá, no litoral da Colômbia, conseguiu subir aos céus. Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida humana. E disse que somos um mar de fogueirinhas.— O mundo é isso — revelou —. Um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.
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D’O Livro dos Abraços, de Eduardo Galeano

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Locos Por Ti, America!


Roda viva

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Raul Seixas disse que “Sonho que se sonha sozinho é só um sonho. Sonho que se sonha junto é realidade.” Eu poderia reescrever essa sentença acrescentando que “sonho compartilhado se multiplica generosamente em amor.”

Por motivos outros permaneci os últimos quinze anos sem sonhar, apenas administrando as intempéries da vida. Felizmente nenhuma realidade é imutável e como bem disse o bom e velho Marx, “o homem é sujeito da sua história”. Pois estou sendo sujeito da minha história, voltei a sonhar e fui além. Compartilhei esse sonho e ele generosamente se transformou em amor.

Amor capaz de transformar vidas, realidades, humores, impulsionar sonhos que novamente se transformarão em amor que transformará outras vidas, realidades… E assim como numa engrenagem, tudo vai se encaixando e fazendo girar essa roda viva.

Estou girando no meio dessa engrenagem chamada vida, cortejando a esperança logo ali e alimentando de amor meu cotidiano. Enfim, vivendo!

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Loca por ti, America!


Somo todos Marcos!

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Do Congresso da UNE de 1995, em Brasília, trouxe boas lembranças, contatos com a Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (ENECOS) – que me valeram mais que o curso inteiro – e algumas camisetas, daquelas brancas de protesto típicas dos estudantes da esquerda. Uma delas tinha uma foto do líder do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) do México e a frase “Somos todos Marcos”. Adorava essa camiseta e a usava com orgulho. O comandante Marcos deu um novo fôlego à esquerda mundial com sua ousadia e criatividade na capacidade de comunicação, usando a internet – que ainda engatinhava – para divulgar a opressão desumana sofrida por seu povo em Chiapas.
Infelizmente a camiseta se perdeu, mas a mensagem não. Essa madrugada a reencontrei em vídeo. Todos nós que lutamos por democracia, trabalho, educação, saúde, moradia, justiça, cultura, alimento, independência, paz, informação, terra e liberdade nesse continente, somos Marcos.
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Locos Por Ti America!
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As estrelas

Tocando a flauta declara-se amor ou anuncia-se o regresso dos caçadores. Ao som da flauta, os índios walwai convocam seus convidados. Para os tukano, a flauta chora; e para os kalina, fala, porque quem grita é trombeta.
Nas margens do rio Negro, a flauta garante o poder dos varões. Estão escondidas as flautas sagradas e a mulher que as vê merece a morte.
Em tempos muito remotos, quando as mulheres possuíam as flautas sagradas, os homens carregavam lenha e água e preparavam o pão de mandioca.
Contam os homens que o sol indignou ao ver que as mulheres reinavam no mundo. O sol desceu à selva e fecundou uma das virgens, deslizando sucos de folhas entre suas pernas. Assim nasceu Jurupari.
Jurupari roubou as flautas sagradas e entregou-as aos homens. Ensinou-lhes a ocultá-las e defendê-las e a celebrar festas e rituais sem mulheres. Contou-lhes, além disso, os segredos que deveriam transmitir ao ouvido de seus filhos varões.
Quando a mãe de Jurupari descobriu o esconderijo das flautas sagradas, ele condenou-a à morte; e de seus pedacinhos fez as estrelas do céu.
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Do livro Memória do Fogo, Nacimentos de Eduardo Galeano
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Locos por ti, America!
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