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Biscate de Luta e a Marcha das Vadias em Pelotas

Texto meu postado originalmente no Biscate Social Club

Não sou uma biscate qualquer.

A biscate que sou só eu poderia ser. Ou, a mulher que sou só eu poderia ser. Ou ainda, a pessoa que sou só eu poderia ser. Somos todos assim, construídos de pequenos detalhes, grandes diferenças, caminhos trilhados com dificuldade ou não, escolhas, dores, alegrias… Vida vivida.

Entre as minhas escolhas estão ser comunista — reconheço a que classe pertenço neste mundo capitalista, reconheço a opressão sofrida por esta classe, me rebelo, quero e luto para construir outro mundo, com outro sistema, sem classes e baseado na cooperação mútua tendo o ser humano como parâmetro — e feminista — reconheço meu gênero e todas suas implicações e opressão sofrida, e luto por um mundo antimachista, construído na parceria entre gêneros.

Para além de ser feminista, percebi que a opressão de gênero é um dos pilares de sustentação da opressão de classe e que essas duas opressões estão intimamente ligadas (a opressão de gênero e a normatização da sexualidade da mulher surge na História junto com a propriedade privada), uma não sobrevive sem a outra e talvez por isso seja tão difícil romper com as duas.

Nesse período do início de março é comum recebermos homenagens e flores e vermos a feminilidade ressaltada. Pois reafirmo, engrossando o coro de milhares de mulheres que lutam ao meu lado, o 8 de Março (leia aqui sobre a origem da data) é um dia de luta, de protesto e de reflexão. Dia de recusarmos as flores e falsas/frágeis homenagens e dizermos em alto e bom som: QUEREMOS É RESPEITO E UMA VIDA SEM VIOLÊNCIA!

Juntemo-nos às Marchas das Vadias e atos públicos desse 8 de Março nas cidades Brasil afora. Vamos às ruas fazer valer nossa autonomia e liberdade. Não há outro jeito. Nesse mundo, machista e capitalista, a biscate que eu sou é essa: rebelde, de luta!

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As mulheres de luta de Pelotas irão às ruas no próximo sábado na Marcha das Vadias, para dizer NÃO à violência contra a mulher. Concentração a partir das 11h, no Chafariz do Calçadão da Andrade Neves com Sete de Setembro. Faça o seu cartaz, vista-se da maneira que quiser e compareça.

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Outros Atos e Marchas referentes ao 8 de Março de 2012:

Brasília: 6 a 31/março — Diversas atividades do Fórum de Mulheres do DF.
Belém: 8/março — Caminhada, concentração em frente ao Tribunal de Contas às 9h.
São Paulo: 8/março — Ato e Passeata, concentração na Praça da Sé às 14h.
Recife: 8/março — Manifestação na Praça do Diário, às 15h.
Fortaleza: 8/março — Caminhada das Mulheres, concentração no Parque do Cocó às 16h.
Rio de Janeiro: 8/março — Manifestação, concentração no Largo da Carioca às 12h.
Belo Horizonte: 8/março — Ato e Passeata, concentração na Praça da Estação às 15h.
Natal: 10/março — Marcha das Vadias, concentração Ponte Negra atrás do Vilarte às 14h.
Vitória: 10/março — Ato das centrais sindicais na Assembleia Legislativa às 19h.
Campo Grande: 10/março — Marcha das Vadias, concentração Pça Rádio Clube às 8h30.

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Veja AQUI uma brincadeira, um editorial de moda (NOT) com as fotos que fiz na Marcha das Vadias de Brasília em junho de 2011.


Por que Pimenta com Limão?

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Ontem, duas discussões no Twitter me estressaram. Quem me conhece pessoalmente sabe que não é muito difícil me estressar. A tolerância é um exercício, mas conforme eu consigo esticá-la em algumas coisas, menos sobra em outras. Na verdade são opções minhas não tolerar determinadas coisas por respeito a minha história de vida. Com algumas coisas não quero mais ser tolerante. Vou falar de duas, presentes nas discussões de ontem.
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Falsa neutralidade

Alguém ainda acredita nesse discursinho furado “não tenho ideologia, tenho opinião”? Estou simplesmente saturada desses jornalistas de centro/direita que se julgam acima do bem e do mal e acham que conseguem enganar a todos com suas maravilhosas crônicas críticas a tudo e todos. Suas críticas atacam sempre aos mesmos, mas de vez em quando citam aqueles com quem simpatizam para ‘provar’ sua “neutralidade”, “isenção” e “ética”. (Com licença, fui ali vomitar e já volto!)

Eles julgam nós da esquerda como histéricos. Como se histeria fosse privilégio de apenas um dos extremos. Mas o que dizer desse ex-coronel citado na crônica de Marcelo Rubens Paiva? Não é histeria achar que comunistas “comem crianças e que são o mal encarnado na Terra”?

Os falsos neutros não sabem, mas servem como arma no jogo sujo da direita, para quem ainda identifica as trágicas experiências do socialismo autoritário e burocrático do Leste Europeu com a teoria de Marx. É comunista? Não presta. E para quem acha esse tema superado, prestem atenção no discurso atual da mídia, onde os defensores do PNDH-3 são classificados como subversivos perigosos.

Foi Max Weber quem disse – e não Karl Marx – “Quem se declara neutro já se decidiu, mesmo sem saber, pelo lado mais forte”. Não se encaixa como uma luva no caso dos falsos neutros?

Machismo dissimulado

Nesses tempos chatos onde prevalece o ‘politicamente correto’ e onde as pessoas escondem o que realmente pensam para não serem crucificadas em praça pública, os preconceitos são todos varridos para debaixo do tapete. Vez ou outra afloram, como no caso de Boris Casoy. É como manter uma mola encolhida.

A direita finalmente está perdendo a vergonha e colocando a cara na janela, mas os machistas e os racistas cada vez se escondem mais. Duas leis em vigor no Brasil, necessárias para coibir os abusos cometidos contra mulheres e negros, contribuem pra isso: Lei Maria da Penha e a Lei Caó(*), que combatem as agressões mais grotescas mas só fazem o preconceito aumentar. É como se os racistas e machistas ficassem com raiva por terem seus instintos reprimidos.

Mas quero mesmo é falar daquele machismo embutido em todas as relações e que afloram na forma de pequenas grosserias no dia a dia. Ontem, ao reclamar da chatice de uma discussão teórica que não levaria ninguém a lugar nenhum – ou seja, aquelas velhas discussões sobre o “sexo dos anjos” -, li um sintomático: “Basta não ler se não quiseres”. Simples assim. O detalhe é que essa discussão era no Twitter, onde não ler ou não escrever é ficar de fora de uma discussão.

Entenderam? O macho em questão (talvez não tenha se dado conta, considero também que possa ser um simples caso de reprodução automática) me disse com outras palavras para cair fora da discussão e parar de perturbar. Já ouvi a mesma coisa, nas mais variadas formas, centenas de vezes em longos anos de militância. Não admito mais esse tipo de grosseria comigo e não gasto meu tempo discutindo com pessoas capazes desse tipo de coisa. Simples assim.

Os dois casos de estresse de ontem resultaram em “unfollow” sumário. Deixei de seguir os perfis dos dois cidadãos no Twitter, o “falso neutro” e o “macho alfa que tenta ganhar discussão falando grosso”. Isso mesmo, sou radical.

Sempre me perguntam porque meu blog pessoal se chama Pimenta com Limão. Alguma dúvida ainda?

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(*) A Lei Caó é de 1989, de autoria do deputado constituinte Carlos Alberto de Oliveira (PDT-RJ), e classificou os crimes de racismo como inafiançáveis e imprescritíveis. Em 1997, a Lei n.º 9.459 previu as penalizações e por isso muitas pessoas acham que a lei anti-racismo no Brasil só passou a valer a partir desse complemento.