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Ainda sobre o caso Geisy…

Saiu na Caros Amigos de novembro, um artigo da psicanalista Maria Rita Kehl, intitulado “Facismo Banal”, que, na minha opinião, põe as coisas nos seus devidos lugares nessa polêmica com a Geisy Arruda na Uniban.

Reproduzo trechos a seguir.

A expulsão de Geisy me parece pura covardia da direção da Uniban: vamos nos livrar de um problema com o qual não sabemos lidar

“A massa não é confiável” escreveu Freud em Psicologia de massas e análise do eu (1920). Os indivíduos que participam de uma formação coletiva sob o comando do representante de algum ideal comum são capazes de atos que, se estivessem sozinhos, não se atreveriam a cometer. O superego individual tira uma folga em favor do superego coletivo. Em nome dele, o sujeito dissolvido na massa se precipita em atos extremos que jamais – ou sempre? – sonhara praticar.

Por que os meninos e meninas escandalizados – ou excitados – com o mini rosa shocking da colega a chamaram de “puta”? Usar a palavra puta como insulto revela o ressentimento do homem diante do desejo sexual da mulher, quando esse desejo não é voltado para ele.

(…)

De uma forma ou de outra, é sempre do velho superego que se trata. A moral tradicional explodiu na Uniban com a fúria do retorno do recalcado, aliada ao que? Ao velho comando a favor do gozo, do qual os jovens hoje vivem perigosamente perto demais. A condenação de “puta, vagabunda”, alia-se ao desejo de “lincha, estupra”. São duas faces da mesma moeda, “goza/não goza”, Kant e Sade de mãos dadas, tornados ambos mais cruéis na proporção direta do desprestígio do pensamento na sociedade atual. A conclusão ficaria por conta de Hannah Arendt: quando o pensamento torna-se supérfluo, abre-se o caminho para a banalidade do mal.

Leia aqui a íntegra do artigo de Maria Rita Kehl


De volta ao passado

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Cada um olha o fato pelo ângulo que pode, tem ou convém. Mas para não ficar apenas no discurso feminista, do combate à violência sexista – justo, diante de todos os absurdos que cercaram o caso da Uniban -, vou propor um exercício de raciocínio e tentar apenas fazer algumas perguntas.
Vamos imaginar que um rapaz universitário, de 20 anos, vai à aula com uma bermuda de tecido frágil, sem cueca por baixo e sem camisa, e que ainda – sei lá – “valorize” suas formas com trejeitos e gestos e transite pelos corredores da universidade, entre seus colegas.
Qual seria a reação do público?
Alguém consegue imaginar que diante desta cena um grupo de mulheres fosse em direção do rapaz gritando “almoço livre de graça!”, “vamo pegá!”, “vamo comê!”? E um coro de homens e mulheres o ficassem elogiando: “michê!”, “michê!”, “michê!” ou “corno!”, “corno!”, “corno!”
Até para adaptar os termos que uma multidão como essa, sedenta, gritaria diante do rapaz é difícil. Para os homens até os xingamentos são mais amenos…
É quase impossível imaginar a cena que descrevi porque ela não tem nenhum vínculo com a realidade. E por que? Eu apenas troquei o sexo da vítima na cena de agressão.
Sempre que alguém, ou um grupo, acha que uma mulher precisa ser ‘controlada’, o faz com violência. Se a mulher é fisicamente mais fraca, por que o uso da violência? E por que uma mulher precisa ser controlada?
Por que a sexualidade da mulher é capaz de causar tanto alvoroço?
Por que um grupo se acha no direito de dizer o que bem quiser a uma mulher, e a um homem não?
Por que um país inteiro se acha no direito de julgar o comprimento de um vestido? Se a sociedade dita regras para todos, por que não faz o mesmo com os homens?
Algum homem já foi repreendido por tirar a camisa em público e ‘provocar’ o desejo alheio pelo peito e barriga definidos ou a cueca que ficou aparecendo? Quando é uma mulher e a calcinha aparece, todos logo já entendem que ela está “disponível”. De onde vem esse entendimento coletivo?

o comprimento das saias nos anos 60

Convenhamos, as minissaias usadas nos anos 60 eram muito mais curtas do que o maldito vestido da Uniban. Considero até revolucionário, libertador, para as mulheres o encurtamento das saias há 50 anos atrás. Mas em pleno séc. XXI uma minissaia causar esse furor é, no mínimo, estarrecedor.

Ou viramos todos ogros, ou perdemos completamente a noção das coisas. Eu voto nas duas opções.
A única cena que me vem a cabeça, é a daquele gorila ensandecido batendo com um osso no chão no filme 2001 – Uma Odisséia no Espaço. Somos todos aquele gorila, numa viagem de volta ao passado.
Essa universidade perdeu uma ótima oportunidade de realizar um grande debate sobre comportamento, democracia e igualdade. Enfim, perdeu a oportunidade de formar melhores cidadãos. Seria bom que aqueles alunos se voltassem contra a reitoria com a mesma fúria pelo alto valor das mensalidades… Mas consciência coletiva não é o forte dos alunos da Uniban, já pudemos observar.
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Nota: Esse assunto já havia me cansado. Mas novas opiniões sobre o caso quase que me forçaram a emitir minha opinião.