Arquivo da tag: comissão de familiares dos mortos e desaparecidos

Até quando os arquivos da ditadura permanecerão secretos?

O prazo estabelecido pela Lei da Anistia para que os arquivos secretos da ditadura militar permanecessem fechados expirou durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). FHC criou no final de seu segundo mandato, uma lei com a figura do “sigilo eterno” para documentos com o carimbo de “ultrassecreto”. O presidente Lula (2003-2010) mudou a lei, porém manteve a possibilidade de jamais haver acesso a certos papéis, se assim as autoridades quiserem. E as autoridades querem. Lula reuniu com os familiares dos mortos e desaparecidos, mas nada resolveu.
Para quem deposita muitas esperanças na presidenta Dilma Rousseff sobre a abertura desses arquivos, lembro que ela foi ministra da Casa Civil e responsável direta pelo Arquivo Nacional. Uma das primeiras medidas desse governo foi mudar o Arquivo Nacional da Casa Civil para o Ministério da Justiça, sem deixar claro qual a intenção e motivo da mudança. Só ficou a impressão da perda de importância do AN dentro do governo Dilma. Além disso, é bom lembrar também que estamos iniciando o nono ano do governo petista no Brasil.
Essa semana a ministra dos Direitos Humanos Maria do Rosário esqueceu que é governo e cobrou de FHC a responsabilidade sobre os arquivos, questionando sobre documentos que supostamente teriam sido destruídos entre 1995 e 2002. FHC, do alto de sua covardia e comodidade, declarou ser a favor da abertura dos arquivos. Certo que FHC não tem moral para falar a respeito, mas o governo petista, como um todo, também não tem. Nesse caso Lula e FHC são iguais. Se omitiram em cumprir seu papel e prolongam ad eternum a tortura sofrida pelos familiares dos desaparecidos. A ministra Rosário deveria ter conversado um pouco mais com seu antecessor Paulo Vanucchi sobre as dificuldades internas com esse tema. De concreto não temos nada até agora, nem a Comissão da Verdade já tão polemizada.
Anteontem o assessor especial de Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, confirmou o encontro da presidenta Dilma com as Mães e Avós da Praça de Maio em Buenos Aires na próxima segunda-feira (31). “Garcia disse que o encontro foi agendado a pedido de Dilma. “A presidenta tem uma grande sensibilidade para questões relativas aos direitos humanos”, afirmou o assessor. “Essa iniciativa da presidenta [em receber essas senhoras] valoriza muito essa luta emblemática que essas senhoras têm na história política recente da Argentina”, disse ele.
Porém, Garcia afirmou que, por falta de tempo, Dilma não poderá visitar o Museu da Memória Aberta, construído na área onde funcionou a Escola de Mecânica Armada da Marinha (ESMA) – no local havia um dos principais centros de tortura da Argentina.” (fonte: BRASIL.gov.br)
Alguns fatos me chamam a atenção nessa notícia: 1) A imensa sensibilidade (valorizada na declaração de Garcia) de Dilma com os Direitos Humanos até agora não se explicitou no Brasil com a mesma força. 2) O texto passa a ideia que Dilma está ‘fortalecendo’ o movimento de mães e avós dos desaparecidos argentinos, país que tem um museu para lembrar os horrores da sua ditadura, que abriu os arquivos secretos à mando da presidenta Cristina Kirchner em janeiro de 2010 e vem julgando e condenando os torturadores. 4) A falta de tempo de Dilma em visitar o Museu da Memória Aberta parece evitar um constrangimento maior, já que o ministro Nelson Jobim é um dos membros da comitiva oficial. 5) O que Dilma Rousseff dirá às Mães e Avós da Praça de Maio sobre a abertura dos arquivos da ditadura brasileira? 6) O que dirá sobre as mães e familares dos desaparecidos brasileiros que não tem a mesma ‘sorte’ a atenção do governo petista (desde o tempo de Lula)? 7) O que dirá sobre a anistia estendida aos torturadores pela justiça (sic) brasileira?
Para a coordenadora da Comissão Especial Memórias Reveladas, Alessan Exérdra Mascarenhas Prado, “por temor de revanchismos e punições” as Forças Armadas não abrem seus arquivos. As Forças Armadas não sabem o que é comando ou não tem comando?
Se fosse Dilma, sentiria muita vergonha diante das Mães da Praça de Maio e diante da presidenta Cristina Kirchner que cumpriu seu papel na história, mesmo não tendo sido torturada ou guerrilheira e não sendo ‘esquerda’.
O fio de esperança que tinha sobre a abertura dos arquivos durante esse governo arrebentou quando a presidenta manteve Nelson Jobim como ministro da Defesa.
Alguém avisa à presidenta Dilma Rousseff que a luta das Mães e Avós da Praça de Maio também existe aqui no Brasil? Grata.

Entrevista com Criméia Almeida e Suzana Lisbôa, da Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos, publicada em 12/01/2010 numa blogagem coletiva pela abertura dos arquivos e punição dos torturadores – Verdade e Justiça

Relato de Marcelo Rubens Paiva de 20/01/2011, dia em que Rubens Paiva (seu pai) completou 40 anos de desaparecimento.

P.S. :: Para ler outros textos que publiquei sobre o assunto é só clicar nas tags “ditadura”, “abertura dos arquivos”, “arquivos secretos” ou “desaparecidos” ali na nuvem de tags.

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